terça-feira, 12 de novembro de 2013

Momento Musical - Tears For Fears - Songs from the Big Chair



Cara leitorada, quem disse que o John Galt aqui só fala de Política, Filosofia, Economia e que tais? Também tenho meu lado musical, e hoje eu inauguro aqui no blog a coluna "Momento Musical".

Hoje à tarde eu estava ouvindo na 977.com uma música do Tears for Fears, "Shout" (do disco "Songs from the Big Chair"), e comecei a pensar: por que cacetes murchos eu tenho essa banda como uma das boas e paradigmáticas bandas da década de 1980? No fim das contas, cheguei à conclusão de que é uma banda apenas mediazinha.

O disco de estréia da banda foi exatamente esse que mencionei. Houve discos muito piores do que este na década de 1980, mas também houve discos muito melhores. Prossigo com minha "sessão de terapia", ou seja, estabeleço a raiz do problema e, depois, parto em busca da solução. E qual é a solução 'Gritar, gritar, pôr tudo para fora!'. Fico pensando se o Dr. Janov recebeu royalties dos caras. Provavelmente não.

Esse disco tem dois problemas graves: (a) as músicas suaves e b) as músicas compridas. Como praticamente todas as músicas do disco são compridas, e mais ou menos um terço delas é suave, isso automaticamente me impede de ficar entusiasmadíssimo com ele. A produção, como era de se esperar, é irritantemente "oitentesca" (o que me leva a suspeitar que os caras chegaram no estúdio, disseram aos berros "queremos o melhor que o dia de hoje tem a oferecer!" e pegaram tudo o que deram a eles, sem sequer testar nem nada parecido). E o maior problema disso, claro, é que, mesmo que eles tenham um recado sério a dar (e com certeza eles são melhores em dar recados sérios do que seus colegas mais "toscos" do synth-pop, como o Duran Duran), esse recado se perde debaixo de camadas e camadas de sintetizadores e baterias eletrônicas. Vejam bem, como é possível penetrar na alma sensibilíssima do Sr. Orzabal se ela está enterrada tão fundo? Não dá nem para VÊ-LA!

Pelo menos dá para ver o talento para composição. Eu não sei por que tantas músicas duram cinco ou seis minutos se tudo o que é necessário aparece em três, no máximo quatro minutos, mas eu confesso que alguns dos grooves finais, com vários vocais sobregravados, funcionam bem. Às vezes, 'Shout', por exemplo (sem dúvida a melhor opção para uma abertura de impacto) tem um refrão poderoso que se arrasta sem parar, mas funciona porque a dupla Orzabal e Smith criam uma progressão sombria, quase ameaçadora, acrescentando cada vez mais daquelas camadas sonoras e harmonias vocais a cada passo. O engraçado é que, embora a música seja, em essência, uma convocação para que todos os deprimidos do mundo sigam o exemplo da banda, ela não tem nada de sermão nem é uma música imbecil, talvez porque saibamos que os caras não estão a fim de fingir, e que ela é, na verdade, uma revelação profundamente pessoal. Eu sei que acabei de dizer que não conseguia atingir as profundezas da alma do Sr. Orzabal, mas esta, com certeza, é uma exceção que confirma a regra: 'Shout' é um grito, mas de dor: "DÓI! DÓI! DÓI!".

E se você gostar da música, há muito material de excelente qualidade mais - uma parte dele ligeiramente comprido demais, mas nunca sem pegada. 'Everybody Wants To Rule The World' é um exemplo raro daquelas marchas "militares" de cadência média e compasso quaternário (tão amadas por roqueiros fora de sintonia como o "finado" Rod Stewart) em que a música em questão se salva por causa de uma pegada vocal imaculada e intrincada. Ouçam essa música e me digam se os caras não têm talento para melodia. Eles têm. Essa faixa tem até guitarras estridentes em quantidade suficiente para que ela seja ouvível até para quem ouve Depeche Mode em quantidades homéricas.

'Mothers Talk' não tem nada a ver com o Frank Zappa, mas é uma das faixas mais vibrantes de todas as músicas da banda, e eu posso facilmente imaginar essa faixa tocada por alguém como o Prince. (Isso é um elogio, caso vocês tenham suspeitado o contrário).

O mini-medley 'Broken/Head Over Heels' também é excelente, e eu consigo imaginar a Madonna interpretando. (Tá bom, estou perdendo a mão. Parando AGORA com as analogias).

Enfim, todas essas músicas são boas. Foram estragadas pela produção, com certeza, mas não me entendam mal. Basta olhar além da primeira camada para encontrar, de vez em quando, uma pegada bem interessante, um ritmo legal e uma quantidade enorme de angústia e vazio (e, às vezes, otimismo).

Agora vamos para as outras duas ou três músicas que eu acho que não disse que são uma porcaria.

'The Working Hour' é muito comprida e o arranjo é muito astuto, e, aparentemente, é uma música muito importante para o "conceito" do disco, mas meus ouvidos a ouvem apenas como uma "ração musical" genérica dos anos 80; quem quiser ouvir uma balada contemporânea sentimental cujo arranjo é de extremo bom gosto pode procurar o disco de estréia da Sade, no qual os saxofones são muito bem aproveitados. (Para quem não sabe o que é uma balada no contexto musical, ouça "Faroeste Caboclo". É o primeiro exemplo que me vem a cabeça agora, mas é perfeito para explicar).

A balada para piano 'I Believe', por outro lado, é extremamente despojada, mas o Orzabal não é nenhum Paul McCartney, cacete, e não é nem sequer um Elton John, e, na minha nada humilde opinião, seqüências duras de quatro ou cinco notas no piano, tocadas à exaustão, não fazem uma boa música.

Para encerrar, a última música, 'Listen', não passa de um muzak torturantemente comprido, que funciona por mais ou menos um terço da duração (e até mesmo esse terço tem uma sonoridade que dá a impressão de que o Sr. Paul McCartney "mencionado supra" roubou dele metade das idéias para o disco Press To Play).

Portanto, meus caros, deu para perceber que eu não considero Songs From the Big Chair uma obra-prima. Também dá para perceber, agora, por que os anos 80 produziram tanto lixo musical. Se esses caras escrevessem as mesmas melodias nos anos 60, ou até nos anos 70, quando não dava para disfarçar as "secas" de criatividade com baterias eletrônicas nauseabundas e uma produção cheia de eco, este disco pelo menos seria muito (mas muito) mais aceitável para os ouvidos de hoje. É claro, ele ainda é aceitável, mas eu duvido que a maioria das pessoas sequer queira dar uma segunda chance a ele, que, com certeza, é bem merecida.

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