segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Sobre vacas e milhos: o que significa ser transgênico?

Velaquí, como é xenerosa a cara das vacas!
Neste fim de semana, voltando a São Paulo após sagrar-me vice-campeão num torneio de tênis em Limeira, cruzava o verdejante interior paulistano pela rodovia Anhangüera. É difícil não contemplar a agricultura. Às portas da primavera, já com temperaturas bem elevadas, já está quase tudo verdinho nas plantações. E, é claro, vaquinhas e boizinhos pastando alegremente.

Assistindo a esse cenário pela janela do ônibus, fiquei pensando o que significa para uma planta ou um animal ser chamado de organismo geneticamente modificado (OGM) - popularmente, transgênico. Boa parte do milho nas lavouras pela quais eu passei eram "geneticamente modificadas". Em geral, a modificação genética diz respeito à tecnologia de inserir, retirar, ou "ligar ou desligar" determinados genes do pé de milho. Os cientistas botânicos usam seu conhecimento do DNA para inserir no milho genes que o aperfeiçoam consideravelmente, por exemplo, tornando-o resistente a insetos (falarei disso em outro artigo).

Mas qual é a diferença entre essa "modificação genética" e a que a humanidade já vinha fazendo com os alimentos há milhares de anos?

Pense, leitora, no milho e no gado que eu vi nos campos e nas pastagens. O milho começou sua "carreira" como uma gramínea silvestre que produzia poucos e minúsculos frutos semelhantes a uma espiga. Mais de 5 mil anos atrás, os povos da América Central começaram a selecionar e plantar as sementes das plantas que preferiam, descartando o restante delas. A partir desse momento, depois que o milho começou a viajar pelos continentes, esse cultivo seletivo mudou intencionalmente o formato e o tamanho do milho, lentamente transformando-o nas variedades doce, bicolor e azul que conhecemos hoje.

Pense, também, na bela e generosa vaca. Dóceis produtoras de quantidades abundantes de nutritivos leite e carne, as vacas modernas são o resultado de mais de 10 mil anos de modificações influenciadas pelo homem. As vacas evoluíram do que eram: uma besta selvagem e com cascos chamada auroque. A domesticação do auroque começou há tento tempo que os arqueólogos se referem a esse período por sua denominação geológica, o Holoceno. Foi nessa época em que nossos antepassados começaram a selecionar e criar os animais que fossem mais úteis para eles, alterando, com isso, a conformação genética da prole.

Na verdade, todos os vegetais e animais que vi nas fazendas pelas quais passei passaram por transformações genéticas radicais desde o tempo de seus ancestrais selvagens.

Nossos antepassados, sem saber absolutamente nada sobre DNA ou genes, influenciaram mudanças na conformação genética do seu alimento, tornando-o mais saboroso, nutritivo e fácil de criar e plantar. Hoje, os cientistas sabem como o DNA dos vegetais e dos animais determina suas características. A ferramenta da engenharia genética (ou da modificação genética) é uma maneira de aproveitar esse conhecimento na busca incessante por alimentos melhores.

Os geneticistas descobriram inclusive maneiras de aperfeiçoar os alimentos através da transferência de genes de uma espécie para outra, como os mamões resistentes a doenças, que emprestam um gene do vírus que os ataca, ou os tomates que incorporam genes de uma flor chamada boca-de-leão. Esses métodos trazem reflexos dos nossos antepassados. Eles evocam os povos do Crescente Fértil que cruzavam o capim Aegilops cylindrica com trigo selvagem para produzir um grão mais resistente, ou os faraós do Egito, que cruzavam burros com cavalos para criar as fortes e robustas mulas. A diferença é a precisão, o conhecimento e a velocidade com que, hoje em dia, é possível fazer esses aprimoramentos.

Portanto, para responder à pergunta que fiz no título deste artigo, a moderna modificação genética é simplesmente um método diferente de conseguir exatamente o mesmo tipo de modificação genética que os agricultores conseguem há milênios. Nesse sentido, praticamente todos os alimentos, todas as lavouras e todos os animais domesticados que existem hoje podem ser considerados "transgênicos".

A engenharia genética dos alimentos não é novidade. A novidade está tão somente nas técnicas para realizá-la.

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