Você é a favor do capitalismo ou contra ele? Não dependeria a resposta da definição do termo? Se você, amável leitor deste blog, acreditar que o capitalismo consiste na corrupção maléfica, gananciosa e marginal da sociedade, assim como os abusos vistos na Argentina do papa Francisco, então será contra o capitalismo. O conservador não tolera o capitalismo-amigo, ou seja, a intervenção do governo na iniciativa privada.
A maioria dos eleitores (que anula o voto ou se abstém) tem idéias muito diferentes da sua. Pressupostos arraigados e definições muito variadas estão sendo expostas por um recente debate a respeito do Cristianismo, socialismo e capitalismo. A Exortação Apostólica do papa Francisco e a crítica feita por Rush Limbaugh revelaram diferenças gigantescas na percepção das pessoas sobre o significado real das palavras "capitalismo" e "socialismo".
Este pobre chelá das letras afirma, desde já, que a verdadeira definição de um capitalista é qualquer pessoa que põe em risco o seu capital (dinheiro, ferramentas, equipamentos, imóveis, etc.) sem nenhuma garantia de que fará dinheiro*, nem sequer de que conseguirá recuperar o capital investido, esperando conseguir dinheiro suficiente para pagar o custo do investimento e, depois, seguir em frente para conseguir lucrar. "Capitalista" também pode significar um defensor desse comportamento como seu sistema econômico preferido.
O capitalismo é a única abordagem capaz de fazer com que a humanidade prospere, especialmente os pobres e desvalidos, porque, num sistema de livre iniciativa, as empresas não podem obrigar ninguém a comprar seus produtos ou serviços. As empresas devem oferecer produtos ou serviços que levem benefícios à sociedade além do preço de compra. Caso contrário, o capitalista fechará as portas. Essa disciplina do mercado explica por que os planos de socorro do governo são nefastos (lembram do PROER?).
Apenas as operações que gerem um benefício líquido para a sociedade ocorrerão. As outras serão frustradas pela escolha dos consumidores. A liberdade é o ingrediente essencial dessa "mão invisível" mágica. Quando o governo sai em socorro de empresas incompetentes ou privilegia seus amigos, ele põe por terra o fator crucial do voluntarismo na compra. Naturalmente, se as empresas mentirem ou cometerem fraudes, as operações voluntárias e transparentes também cairão por terra.
Embora o observador inocente veja apenas o dinheiro batendo às portas do empresário, o empresário precisa fazer muito dinheiro apenas para recuperar o investimento inicial antes de conseguir algum "retorno'. Depois disso, qualquer "lucro" pode ser apenas uma renda modesta de que o empresário precisa para pôr comida na mesa da sua família, se vestir e ter um teto sobre a cabeça.
Portanto, a definição deste escriba do que é capitalismo faz com que o "capitalismo-amigo" não seja capitalismo coisa nenhuma. Ele é um problema grave e um mal terrível em si. Dizem que se a vitória é certa, então não há jogo. Se os políticos corrompem o mercado para favorecer seus cupinchas, estes não estão arriscando seu capital, porque o jogo é de cartas marcadas.
De acordo com vários mitos arraigados no inconsciente coletivo, a esquerda cristã e outros críticos do capitalismo acreditam que:
(1) Os capitalistas são (sempre) barões podres de ricos. Ou seja, pequenos empresários não podem ser capitalistas. Apenas as grandes empresas, apenas os muito ricos, são capitalistas. Uma pessoa bem próxima de mim investiu todas as suas economias para abrir uma loja de conveniência "sem bandeira" no interior de São Paulo muitos anos atrás. A família dele nunca teve muito dinheiro, mas, de repente, ela começou a ganhar dinheiro feito água, principalmente porque ela tinha idéias brilhantes de marketing e trabalhava com afinco, "dormindo tarde e acordando cedo". Os filhos ajudavam. Acontece que uma tempestade brava veio e o teto da loja desmoronou porque a construção não era das melhores. Os defeitos, imperceptíveis pela aparência externa, venceram. Normalmente, nenhuma construção de alvenaria decente desmorona por causa de uma tempestade, que é algo esperado. Essa pessoa ficou financeiramente arrasada. Ela processou o ex-proprietário do imóvel, mas perdeu, numa decisão judicial ridícula. Ela arriscou suas economias, trabalhou com dedicação, mas, mesmo assim, perdeu tudo. Entretanto, essa pessoa não era um capitalista segundo a esquerda cristã, pois tinha uma pequena empresa, não era um magnata com jatinho, mansão, iate, "e a porra toda".
(2) Os capitalistas são gananciosos. Essa definição de "capitalista", o conceito em si, exclui qualquer possibilidade de doar aos pobres ou a instituições beneficentes. Um capitalista não procura apenas conseguir riqueza, mas também acumulá-la sem finalidade alguma. Milhões de brasileiros (eleitores) acreditam que fazer doações aos pobres é algo completamente incoerente com o fato de ser um capitalista. Naturalmente, a maioria das instituições beneficentes destepaiz foi financiada por capitalistas muito ricos. Querem um exemplo, Antônio Ermírio de Morais.
(3) Muita gente acredita piamente que um capitalista é alguém que contrata funcionários. Karl Marx acusava os capitalistas de explorar os trabalhadores, e muitos brasileiros aceitam uma análise marxista da Economia. Eu sou um tradutor autônomo que trabalha em casa. Invisto em equipamentos de informática, software, dicionários (online e em papel), tenho despesas altas para manter uma estrutura de apoio que me permita dedicação total ao trabalho, etc., e ofereço meus serviços a clientes particulares e agências de tradução. Eu não posso ser considerado um capitalista porque não exploro nenhum trabalhador. Preciso virar madrugadas de vez em quando para manter toda essa estrutura, que posso perder se não conseguir um volume de trabalho suficiente. Eu sou meu único funcionário. Mas um capitalista é só aquele que explora os trabalhadores.
O primeiro papa, Pedro, tinha um empreendimento de pesca com André e os filhos de Zebedeu. Eles precisavam pescar muitos peixes apenas para empatar o custo de vários barcos, redes, etc. Mas o cristão esquerdista argumenta que, se eles não exploravam trabalhadores contratados, não eram capitalistas. Na verdade, já houve quem me dissesse que apenas a maneira como Karl Marx define um capitalista é válida, porque Karl Marx fez uma crítica ao capitalismo.
(4) Os capitalistas são "malvados". Muitos eleitores consideram o personagem Tio Patinhas, de Walt Disney, como o parâmetro cultural de um capitalista, mercê, principalmente, de um livrinho nojento dos "intelequituais" Ariel Dorfman e Armand Mattelart, intitulado Para leer al Pato Donald. Essas impressões são, obviamente, imprecisas, indefinidas, nebulosas e irracionais. No entanto, as pessoas pressupõem que ser um capitalista significa, obviamente, ser uma pessoa má.
Na verdade, vários pressupostos impulsionam comportamentos e votos do público, especialmente de eleitores que prestam muito pouca atenção à política (às vezes chamados de "eleitores alienados"). Entender o que esses eleitores não entendem é o primeiro passo para tentar recuperar uma certa racionalidade nos debates e na política do Brasil.
(*) Eu uso a expressão "fazer dinheiro" não como um decalque semântico-lexical da expressão correspondente making money em inglês, e sim por considerar que "ganhar" é um verbo que, usado nesse contexto, não pressupõe o componente "esforço". Nem funcionário público nem o assalariado mais inepto "ganham" dinheiro. Food for thought.
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