Eu quero que meus aparelhos funcionem. Eu quero que os aviões cumpram os horários de partida e chegada. Eu quero que a eletricidade e a Internet funcionem. Eu quero usar minhas coisas que são úteis. Eu quero utilizar meus utilitários. E quem não quer tudo isso? Todos valorizam as soluções eficientes, eficazes e econômicas, e é assim que deve ser. Para os problemas do dia-a-dia, somos todos utilitaristas.
No entanto, aplicado aos sistemas sociais, o utilitarismo é inútil. A proposta prática do utilitarismo é perguntar “o que proporciona o maior bem para o maior número de pessoas?” Esse lema foi cunhado pelo excêntrico inglês Jeremy Bentham (1748 -1832). Bentham também fez a seguinte observação: “A natureza pôs a humanidade sob o comando de dois mestres soberanos: a dor e o prazer” (The Principles of Morals and Legislation, p. 1, Capítulo 1).
“O maior bem para o maior número de pessoas. Motivado pela dor e pelo prazer”. Aparentemente, isso funciona. Contudo, os problemas do utilitarismo ficam claros quando colocamos um pouco mais de pressão teórica sobre seus pressupostos. O primeiro problema do utilitarismo é a opinião pessoal. Podemos concordar que queremos o maior bem para o maior número de pessoas, mas não é possível chegar a um acordo sobre o que, em princípio, é bom. As opiniões pessoais variam.
Sem critérios externos e mais universais, quem pode dizer o que é “bom”, e a quem cabe escolher? Basta examinar a Rússia estalinista para ver um exemplo histórico claríssimo de algumas pessoas decidindo qual seria “o maior bem para o maior número de pessoas”, tendo como resultado um grande bem para um pequeno número de pessoas, e um grande mal para um número muito maior.
O segundo problema do utilitarismo é o da proporcionalidade. Que nível de "bondade" procuramos atingir? É bom que um cidadão tenha o que comer, e é ainda melhor que ele tenha acesso à educação. Melhor ainda será se ele tiver pleno acesso à saúde. Mas e se o verdadeiro bem para uma pessoa for mais que isso? É bom quando as necessidades físicas são atendidas, mas melhor ainda é viver por algum objetivo ou alguma finalidade maior. E o amor, a beleza e a verdade? E a possibilidade de atingir a perfeição moral? Não há dúvida de que são exemplos de um bem muito maior.
A realização pessoal e a perfeição moral (que são grandes bens) só podem ser conseguidas através de dificuldades, autodisciplina e sacrifício pessoal. Para atingir esse bem maior, é necessário passar por dificuldades. Portanto, para conseguir o maior bem para o maior número de pessoas, pode-se, por exemplo, precisar fazer a guerra ou aceitar uma redução de salários ou trabalhar mais horas por dia. Agora, passo a levar em conta a proporcionalidade do bem. Queremos que o maior número de pessoas receba um bem realmente e incrivelmente muito grande, ou queremos que elas se contentem apenas com pão e circo?
O terceiro problema do utilitarismo tem a ver com o segundo. É o problema da dor. Se buscamos o maior bem para o maior número de pessoas, isso implica que queremos o maior prazer para o maior número de pessoas, mas o verdadeiro prazer não pode ser atingido sem dor. Quero dizer que qualquer coisa que valha a pena ter vale a pena pagar. Qualquer coisa que proporcione um prazer verdadeiro e duradouro custa alguma coisa. Pode custar tempo, dinheiro, autodisciplina, ou abnegação. Portanto, para que o maior número de pessoas possa ter o máximo prazer, elas devem passar por algum tipo de dor. Elas devem pagar por seu prazer (do contrário, não será um verdadeiro prazer).
Além disso, e se o “bem” que alguém decide ser necessário para o maior número de pessoas não for bom para mim? E seu eu não quiser o bem que alguém decidiu que eu devo ter? E se eu não quiser participar do programa de esterilização ou da política de "filho único" que o Estado impõe? E seu eu não quiser prestar o serviço militar obrigatório? Nesse caso, o ideólogo utilitarista deverá usar a força para impor esse “maior bem para o maior número de pessoas”. Portanto, ele não proporcionará o maior bem, mas um grande mal em sua ingênua tentativa de estabelecer o "bem maior".
Isso nos leva ao quarto problema do utilitarismo: o poder. Para que o utilitarismo funcione, alguém, nalgum lugar, precisa decidir o que é bom para o maior número de pessoas e, depois, impor essa decisão. Esse poder pode ser uma ditadura, ou pode ser a tirania do domínio da maioria. Seja como for, é possível impor um grande sofrimento e grandes crimes podem ser cometidos em virtude dos poderes de quem decidir o que proporcionará o maior bem para o maior número de pessoas. Cegos por seus sonhos utópicos, eles eliminarão sem pejos todos os que atrapalharem seu progresso para o admirável mundo novo.
É por isso que o utilitarismo, por si, não traz o maior bem para o maior número de pessoas, e sim o maior mal. O utilitarismo só pode funcionar como um critério menor de "bem". O louvável objetivo do "maior bem para o maior número de pessoas" precisa ser equilibrado e limitado por um código moral superior que não pode ser inventado pela humanidade, um código moral proveniente de uma autoridade superior e dado à humanidade por meio de revelação. Chamamos esse código de "Os Dez Mandamentos".
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